Uma empresa mineira foi condenada pela Justiça do Trabalho a pagar
salários e reflexos sobre demais verbas trabalhistas a uma auxiliar de
serviços gerais que ficou um ano e meio sem remuneração por divergência entre
o empregador e a Previdência Social sobre seu estado de saúde. Após um longo
período de licença médica, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS)
entendeu que ela estaria apta ao trabalho. Por meio de avaliação médica,
porém, a companhia discordou da alta e a encaminhou novamente ao órgão, que
voltou a negar o auxílio-doença. Ao tentar voltar ao trabalho, a auxiliar foi
barrada mais uma vez.
Assim como a auxiliar de serviços gerais, outros trabalhadores, deixados
nessa situação conhecida como "limbo jurídico", têm obtido
indenizações na Justiça. Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) e o Tribunal
Superior do Trabalho (TST) têm condenado empregadores a pagar salários e
demais verbas, ainda que não concordem com a alta médica determinada pelo
INSS. Em alguns casos são concedidos ainda danos morais.
Ao analisar o caso da auxiliar de serviços, o juiz convocado Jessé Cláudio
Franco de Alencar, da 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de
Minas Gerais, entendeu que a empresa é responsável pelo pagamento dos
salários enquanto discute com o INSS a aptidão da empregada ao trabalho.
Alencar considerou inadmissível a situação de eterna indefinição pela qual
passou a empregada. Segundo o juiz, a funcionária "não pode ser
submetida indefinidamente ao impasse de a empregadora recusar a lhe oferecer
o posto de trabalho em decorrência de uma incapacidade que não é reconhecida
nem pela autarquia previdenciária nem judicialmente".
Em um caso analisado recentemente pelo TST, os ministros da 6ª Turma também
foram unânimes ao manter decisão que condenou um condomínio em Salvador (BA)
a pagar salários e demais verbas a um vigia que, depois de um longo período
de afastamento e de ter alta pelo INSS, foi considerado inapto ao trabalho
por uma clínica particular contratada pelo empregador. Posteriormente, ele foi
demitido.
A relatora, ministra Kátia Magalhães Arruda, rejeitou o recurso do condomínio
que defendia a tese de que houve abandono de emprego. Ela citou trechos da
decisão de segunda instância que demonstram que o vigia provou que não teria
sido aceito no seu retorno ao trabalho. Assim, a turma manteve decisão do
Tribunal Regional do Trabalho da Bahia que condenou a empresa a pagar os
salários retidos, seus reflexos e indenização de R$ 5 mil por danos morais.
Para os desembargadores, "se o empregador discorda da decisão do INSS
que considerou seu empregado apto para o trabalho, deve impugná-la de algum
modo ou mesmo romper o vínculo, jamais deixar seu contrato de trabalho no
limbo, sem definição."
De acordo com o advogado e professor Túlio de Oliveira Massoni, do Amauri
Mascaro Nascimento & Sonia Mascaro Advogados, a tendência dos tribunais é
atribuir ao empregador a responsabilidade pelo pagamento de salários aos
empregados. Para o advogado, ainda falta sensibilidade para tratar dessa
questão no Brasil. "Evidentemente que o empregado não pode ficar sem
salários até que seja decidida a sua pendência previdenciária.
Mas há inúmeros casos em que ele próprio se recusa a retornar ao
trabalho por realmente discordar da conclusão do INSS", diz.
Os tribunais, segundo Massoni, poderiam adotar uma alternativa para esses
casos: a empresa se comprometeria a pagar os salários até que o recurso seja
analisado pela Previdência Social. Se o INSS reconsiderar sua decisão,
pagaria os salários do segurado retroativamente e o empregado se
comprometeria a devolver os valores antecipados.
Porém, enquanto vigorar a divergência com o INSS, Massoni recomenda que o
empregador tente de todo modo buscar uma readaptação do empregado, com a
ressalva expressa de que está se submetendo ao entendimento do INSS.
O médico do trabalho Nelson Chaves, que assessora empresas no processo de
readaptação, afirma que o perito do INSS nem sempre sabe exatamente qual a
atividade exercida pelo profissional ao conceder a alta. Para ele, caberia
então ao médico da empresa ressaltar no recurso as condições de trabalho e
porque não estaria apto a retornar. "De qualquer forma, como a medicina
não é exata, podem haver pontos de vistas diferentes", afirma.
O advogado Helio Gustavo Alves, do HGAlves Advocacia Previdenciária, em
Blumenau (SC), que defendeu tese de doutorado sobre o tema, faz a mesma
recomendação. Ele tem orientado médicos de empresas a acompanhar como
assistentes essas perícias médicas ou preencher no site da Previdência Social
a Solicitação de Informações ao Médico Assistente (Sima) para fornecer
detalhes que o perito do INSS muitas vezes não tem. "Há casos em que o
perito muda totalmente sua decisão", diz.
Apesar da alta do INSS, alguns funcionários são obrigados ainda a passar por
um processo de reabilitação profissional. Para Alves, esse processo, por lei,
não deveria ser responsabilidade do empregador. Recentemente, o advogado
obteve decisão nesse sentido, que obriga a Previdência Social a custear esses
gastos
Por nota, a assessoria de imprensa do INSS informou que o órgão concorda com
o entendimento da Justiça do Trabalho. Segundo o INSS, nos casos em que o
segurado discorda da alta concedida, "a via administrativa lhe faculta o
pedido de prorrogação do benefício, o pedido de reconsideração da decisão que
reconhece a sua capacidade para o trabalho, bem como a possibilidade de ser
interposto recurso perante o Conselho da Previdência Social, órgão composto
por representantes do governo, empresários e trabalhadores".
Fonte:
Valor Econômico
|
Nenhum comentário :
Postar um comentário
Deixe aqui o seu comentário, dúvida ou sugestão